Nesta terça-feira (30), mais de 100 pessoas de diversas partes do mundo se “encontraram” em uma sala virtual para o webinário “Economia feminista e ambientalismo para uma recuperação justa: olhares do Sul”, organizado por Amigos da Terra Internacional (ATI) e pela Red Latinoamericana de Mujeres Transformando la Economía (REMTE), com participação de Karin Nansen (presidenta de ATI) e Nalu Faria (REMTE e membro do Comitê Internacional da Marcha Mundial das Mulheres). A mediação foide Letícia Paranhos (AT-Brasil). Estiveram presentes pessoas do Chile, Argentina, Brasil, Moçambique, Austrália, Holanda, Alemanha, Japão, Escócia, Togo, Equador, Estado Espanhol, África do Sul, Peru, Uruguai, Colômbia, Irã.
O debate fez parte do Fórum Social Mundial de Economias Transformadoras, que ia acontecer nesta semana na Catalunha e, devido à necessidade de isolamento social generalizado, se manteve de forma virtual. O Fórum reúne 400 organizações, com o sentido de afirmar que a economia e a vida devem caminhar juntas. Funcionou a partir de debates autogestionados entre movimentos, com o esforço de relacionar o local e o global e apontar para alternativas.
Como disse o convite, a atividade partiu do “entendimento de que a crise sanitária que enfrentamos é consequência do sistema capitalista, racista e patriarcal. A partir daí, fazemos um diálogo sobre as contribuições do ambientalismo e do feminismo para a construção de uma economia que coloque a vida no centro e para uma recuperação justa, baseada na solidariedade, que confronte as causas sistêmicas da pandemia”.
Nalu e Karin partiram da situação de crise sistêmica em que o mundo se encontra hoje para colocardesafios e horizontes a partir da organização popular. Para Nalu, “a crise da covid-19 surge desse modelo, desde a própria origem do vírus até a forma como ele chega em nossos países, em uma situação já de crise, de desemprego, de políticas de austeridade, precarização da vida”.A pandemia “escancarou o que é a desigualdade em nossos países e também escancarou a opção dos setores que hoje têm poder nas nossas sociedades e que privilegiam, a todo tempo, o mercado em detrimento da vida humana”.
O que organiza o mundo como o conhecemos é a exploração do trabalho da maioria das pessoas. As mulheres, além da precarização do trabalho pago, são também responsabilizadas pelo trabalho doméstico e de cuidados. “O trabalho doméstico hoje é feito de forma injusta e desigual, e o que precisamos pensar é uma nova forma de reorganização e redistribuição desse trabalho de cuidado”, a partir de uma visão de sociedade que coloque a vida no centro. “É preciso que assumamos nossa dependência perante a natureza e também entre nós”, pontuou Nalu.
Contra as perspectivas voltadas para o mercado, que arriscam especialmente a vida das mulheres e da população negra, Nalu afirmou que o momento de crise exige uma transição para um novo modelo de sociedade, que se permita perguntar: “O que é mesmo que nós precisamos produzir, como e para quem, para responder às nossas necessidades?”. Para isso, a economia feminista se apresenta “não só como um campo de análise e estudo, mas como uma ferramenta de luta”, que crie sínteses políticas comuns rumo a uma transformação social profunda.
Karin colocou que “as transnacionais controlam cada vez mais os governos e os sistemas de governança”. Esse avanço das transnacionais conduz a expansão dos sistemas de produção baseados, por exemplo, em atividades extrativistas, disse ela. Além disso, o poder das grandes corporações “se expressa também na destruição dos direitos da classe trabalhadora, no desmonte da seguridade social, em sistemas de saúde debilitados que convertem a saúde em uma mercadoria”.
A presidenta da Amigos da Terra Internacional avaliou que “esse sistema é incapaz de garantir os cuidados para a vida”, e que ele “se sustenta com a exploração do trabalho das mulheres”. “É uma crise múltipla, que tem a acumulação do capital no centro de suas causas. Isso está na própria origem da pandemia”, disse.
Ao tratar das possíveis saídas dessa crise sistêmica agravada pela pandemia, Karin manifestou que as respostas precisam ter como centrais as classes populares, as e os trabalhadores, as mulheres, a população negra, as comunidades quilombolas, indígenas, camponesas, entre outras.
“Uma recuperação justa passa por abandonar as medidas de austeridade, reivindicar o papel do Estado, da política e das políticas públicar, retomar o controle dos serviços públicos. Também precisamos avançar no internacionalismo como cooperação entre os povos, com um multilateralismo que priorize os direitos coletivos dos povos”.
As intervenções das e dos participantes apontaram para a superação do modelo neoliberal, relacionando com a construção da soberania alimentar, dos movimentos em unidade internacionalista e das experiências locais de resistência e organização. Estavam presentes pessoas organizadas naATI, na Marcha Mundial das Mulheres e REMTE; no Movimento de Atingidos por Barragens (MAB),MST,MTST, Rede de Economia Feminista e Solidária (RESF), Movimento de Mulheres Camponesas, CUT,Articulação Nacional de Agroecologia y Centro de Estudos Ambientais de Brasil; na Red Nacional de Semillas Nativas y Criollas e REDES/AT de Uruguay; no GRAIN, Radio Mundo Real (ATI), Women United Against Destructive Resource Extraction (WoMin), Christian Aid, Kebetkache Women Development and Resource Centre da Nigéria, ColectivoVientoSur do Chile y CENSAT/AT Colômbia.
Esta notícia foi redigida pela Marcha Mundial das Mulheres do Brasil e pela Rádio Mundo Real. Convidamos a assistir o vídeo na íntegra aqui: