Na semana passada a SOF participou da duas atividades durante a Feira Estadual da Reforma Agrária em Campinas (SP), um debate sobre diversidade, gênero, raça e classe na construção do poder popular e também de uma roda de conversa sobre superação da crise climática. Os espaços fizeram parte de atividades de estudo e formação que, juntamente com alimentação saudável, arte, cultura, feira de produtos e artesanato fizeram parte da feira que aconteceu entre 24 a 26 de maio de 2024.

A seguir, uma pequena síntese do debate sobre mudanças climáticas, originalmente postado na página do MST:

Por Wesley Lim, da Página do MST

O Movimento Sem Terra realizou na manhã deste domingo (26), uma Conferência Popular na Estação Cultura, em Campinas (SP). Com o objetivo de refletir sobre os efeitos da crise climática no Brasil e no mundo, compreendendo a importância da Reforma Agrária Popular nesse enfrentamento.

A Conferência faz parte da programação da Feira Estadual da Reforma Agrária Neusa Paviato, que se encerra neste domingo (26), com um conjunto de atividades formativas, culturais e de comercialização de alimentos saudáveis, artesanatos, pratos típicos, entre outros produtos.

Com base na questão “quais as saídas concretas para superação da crise climática?”, a Conferência propôs realizar apontamentos práticos de ações e perspectivas políticas capazes de desenvolver processos de organização social, fortalecimento da produção de alimentos saudáveis pelos camponeses e na construção de lutas populares que denunciem o modelo de produção do agronegócio.

Para o debate, o espaço contou com a participação do deputado federal Nilto Tatto (PT/SP), e Miriam Nobre, coordenadora da SOF e militante da da Marcha Mundial de Mulheres (MMM), a Conferência teve a contribuição de Carla Bueno, do Setor de Produção, e Gilmar Mauro, da Coordenação Nacional do MST.

Em linhas gerais, as reflexões analisaram o atual cenário político, com base na conjuntura sócio ambiental, com a perspectiva de apontar elementos capazes de frear o acirramento da crise climática. A devastação dos biomas brasileiros foi um primeiro elemento sinalizado durante a Conferência.

De acordo com o MapBiomas, a área desmatada no Brasil cresceu 22,3% em 2022 segundo o mais recente Relatório Anual de Desmatamento (RAD 2022) da instituição, que consolida dados de todo o território nacional e seus biomas. Foram identificados, validados e refinados 76.193 alertas, que totalizaram 2.057.251 ha de desmatamento no ano passado.

Esses dados aparecem como elemento transversal nas reflexões, com o objetivo de chamar atenção para gravidade do tema e apontar o modo de produção do agronegócio como um dos principais atores dessa crescente. A agropecuária, por exemplo, consolidou-se como o principal vetor da derrubada de árvores, provocando 95,7% da devastação, o equivalente a 1,96 milhão de hectares. A atividade provocou em 2022 um impacto muito maior do que o garimpo, que devastou 5,9 mil hectares, e a mineração, com 1,1 mil hectares, aponta também o relatório.

Gilmar Mauro, olhando para esses números, alerta que a destruição da Amazônia vai construir um processo de desertificação no país. “A situação tende a piorar. Para parar de emitir gases, por exemplo, a humanidade precisaria abolir as tecnologias, como o automóvel e a utilização do petróleo. Destruir essas tecnologias causaria uma brutal contração econômica. Qual país do mundo faria isso?”.

Ele afirma que mesmo a Conferência das Partes (COP) dizendo que precisa diminuir as emissões, “nós não temos nenhum país do mundo que abriria mão dessas tecnologias. Ou seja, não vai ter diminuição de gases porque é da natureza e da lógica do capital produzir lucro, se expandir e acumular”.

Reforma Agrária Popular

Nesse sentido, Nilto Tatto explica que os setores do agronegócio que mais desmatam, queimam, que exploram os bens comuns da natureza é o setor que mais recebe investimento público e, por isso, “precisamos denunciar essa forma de funcionamento do Estado”. Do outro lado, “precisamos destacar que o modelo de agricultura que vai enfrentar a crise climática, é a agricultura familiar. E ela precisa desse investimento, de acesso a políticas públicas. Para isso acontecer, é preciso construir a Reforma Agrária.”

Mirian Nobre segue o mesmo caminho narrativo e afirma que “a Reforma Agrária Popular é um jeito de recuperar vida! Porque a agroecologia, que é o processo de obter e experimentar conhecimentos, é muito intenso nas relações pessoais e nas relações com a natureza”.

Além de apontar a Reforma Agrária como uma saída frente a crise climática, Tatto sinaliza também que é fundamental avançar na construção de “uma consciência ambiental”. Ele ilustra isso, ao sinalizar que a tragédia no Rio Grande do Sul provocou uma comoção nacional de solidariedade e o desafio é “como é que esse movimento, mobilização, pode gerar uma tomada de consciência?”. E continua: “precisamos canalizar esse movimento solidário para a política e para necessidade de mudança. É importante fazer esse debate porque temos um quadro da política nacional repleta de desafios”, enfatiza. 

Alimentação saudável frente à crise

“Quando estamos falando sobre as questões climáticas e, estamos sendo impactos por elas, temos a oportunidade de avançar nas reflexões coletivas em torno desse processo […]. Quando a gente [MST] decidiu dialogar com a população urbana sobre alimentação saudável, a gente decidiu também massificar a agroecologia. A gente precisa fazer isso, garantindo maior biodiversidade alimentar”, explica Carla Bueno.

Nessa linha, ela conta que a agroecologia tem múltiplas raízes e a mais importante é a que vem de nossas bases ancestrais de produção. Porque é essa base que posiciona o elemento arbóreo. “Ou seja, uma forma de produzir capaz de reposicionar a produção de alimentos sem derrubar árvores”, argumenta.

Tendo isso como plano de fundo, ela diz ainda que é necessário alterar o padrão de consumo e “nós queremos construir os mercados populares, capazes de fortalecer a produção local, baratear o preço e, para isso, é fundamental massificar a produção, a agroecologia, desenvolver um modelo que potencialize o cooperativismo e o associativismo”, desafia Bueno.

Esse conjunto de elementos políticos e ações concretas nortearam o debate da Conferência, que conseguiu ao final, reafirmar a luta popular como uma frente estratégica, necessária e, para isso, é fundamental que ocorram mobilizações no campo, através da ocupação de latifúndios, mas também na cidade, denunciando o agronegócio.