Na tarde da segunda-feira, dia 27 de novembro, trabalhadores de um galpão de reciclagem de resíduos urbanos perto da Estação da Luz, no Centro da cidade de São Paulo, presenciaram um encontro muito especial. Colaboradoras/es e participantes do Programa Reviravolta, uma iniciativa do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos que atua junto à população em situação de rua, receberam mulheres agricultoras do Vale do Ribeira envolvidas na agroecologia feminista e solidária.
O motivo do encontro também foi muito especial: na semana anterior, o Programa Reviravolta havia realizado sua primeira compra de produtos agroecológicos cultivados pelas mulheres do Vale. As compras foram organizadas de maneira autogestionada por grupos de consumo de São Paulo e pela SOF – Sempreviva Organização Feminista. No total, foram transportados quase uma tonelada de alimentos como inhame, mandioca, banana, chuchu, cenoura, pimentão e repolho, entre outros, entregues para o programa e outros cinco grupos de consumo em São Paulo.
Logo de madrugada, oito agricultoras do Vale do Ribeira haviam enfrentado a mesma longa estrada que seus produtos percorrem todo mês para conhecer e conversar de perto com quem consome sua produção. Mulheres da SOF e de outros grupos de consumo também participaram do encontro no projeto Reviravolta. No galpão, foram calorosamente recebidas pelas 23 pessoas que participam do programa.
“Se o campo não planta a cidade não janta!”
“Essa troca de experiências é muito importante para a organização de nossa cooperativa, para que ela possa abranger suas atividades em uma rede solidária de produção e consumo”, disse Sheila Marcolino, uma das coordenadoras do Programa Reviravolta. Em seguida, Renê Gonçalves, secretário executivo do Centro Gaspar Garcia, explicou o histórico da atuação com a população em situação de rua que trabalha com reciclagem.
A situação da população que está nas ruas é a mais grave da sociedade urbana. São pessoas que vivem em extremo abandono e miséria, expostas aos riscos da violência e de discriminação e sem acesso aos direitos essenciais. As pessoas que chegam à situação de rua passaram por um processo de perdas e rompimentos de vínculos em vários aspectos da vida como o emprego, a moradia, a separação da família e até da própria identidade. Além das necessidades básicas, quem está em situação de rua precisa de espaços em que se sinta valorizado, onde possa reavivar suas capacidades e ser respeitado como ser humano dotado de potencialidades, objetivos e sonhos.
Após a apresentação inicial, cada participante foi entrando na roda de conversa e falando de suas experiências e reflexões, fazendo ou respondendo perguntas. Assim surgiu, como num mosaico, uma imagem das duas realidades de vida: a das pessoas que estão lutando para sair da situação de rua e encontrar uma recolocação no mercado de trabalho e a das agricultoras que estão lutando para produzir alimentos sem veneno em seu território e levá-los ao consumo alternativo e solidário.
“A luta na roça não é fácil, mas trabalhar na cidade e comer mal também não é. Fico feliz de saber que vocês estão comendo o que estamos produzindo lá”, contou Dolíria, agricultora do Quilombo Terra Seca, na Barra do Turvo. “ A luta é todo dia, né? Mas quando estamos juntas e organizadas é mais fácil”, acrescentou Isaudite, agricultora do bairro Bela Vista, também na Barra do Turvo.
No final da roda de conversa, foi entoado por todas/os ali presentes a palavra de ordem: “Se o campo não planta, a cidade na janta!” E em seguida, os alimentos do Vale do Ribeira foram apresentados aos trabalhadores da cooperativa através de um delicioso café da tarde agroecológico.
Objetivos do programa Reviravolta
O objetivo do programa é contribuir para que a população em situação de rua que busca se reinserir social e profissionalmente possa organizar a vida pessoal e ter acesso a políticas públicas de inclusão social, no sentido de dar uma “reviravolta” em suas vidas. São oferecidas oficinas de cidadania e educação ambiental que buscam acolher e valorizar as pessoas por meio do desenvolvimento de potencialidades e do resgate da autoestima e da esperança, muitas vezes perdidas diante da dura realidade a que foram submetidas.
O encaminhamento para o trabalho formal acontece após a participação em Núcleos Escolas, experiências concretas de geração de renda, por exemplo, a separação de material reciclável e por meio de parcerias com organizações como é o caso da Cooperativa de Catadores Coopere-Centro.
Para saber mais sobre o Centro e o programa Reviravolta, visite o site:
http://gaspargarcia.org.br/projetos/reviravolta-da-populacao-em-situacao-de-rua/