A Marcha Mundial das Mulheres surgiu no ano 2000 como uma articulação internacional feminista e anti-capitalista. Decidiu organizar-se como um movimento social que a cada cinco anos articula uma Ação internacional como momento de fortalecer nossa identidade comum e a solidariedade entre mulheres de todo o mundo. A última em 2005 reuniu cerca de 30 mil mulheres na cidade de São Paulo em defesa de um mundo de igualdade,
solidariedade, liberdade, justiça e paz.
Em 2010 acontece a terceira ação internacional da Marcha Mundial das Mulheres sob o lema “Seguiremos em marcha até que todas sejamos livres”.
A expectativa é que nos 60 países onde a Marcha Mundial das Mulheres está organizada haja uma agenda própria de lutas orientadas por quatro campos de ação em comum, que são: bens comuns e serviços públicos, paz e desmilitarização, violência contra as mulheres e autonomia econômica.
As mobilizações organizadas pela Marcha Mundial das Mulheres também estarão organizadas a partir de outros dois referenciais. O primeiro é que em 2010 completa um século desde a que as mulheres socialistas reunidas em Copenhague aprovaram a proposta do Dia internacional das Mulheres. Retomar a memória perdida desse dia de luta com todo seu significado emancipatório é parte importante do simbolismo presente as mobilizações desse
ano.
O segundo elemento é a solidariedade com as mulheres que vivem em zonas de conflito armado em especial as na Republica Democrática do Congo e na Colômbia. A denúncia da guerra como instrumento de controle dos povos, dos territórios e dos corpos das mulheres é outra marca da 3° Ação internacional.
A plataforma brasileira e o tema do trabalho
No Brasil 3 mil mulheres das diferentes regiões do país se fizeram presentes nos dez dias de caminhada entre as cidades de Campinas e São Paulo levando uma plataforma derivada dos campos de ação reivindicando transformações profundas no país e no mundo.
Saímos às ruas para tornar pública a critica ao mercado e apresentando nossas alternativas para uma sociedade igualitária e justa. Queremos denunciar a divisão sexual do trabalho como estruturante das relações sociais de sexo e por isso instrumento de perpetuação das desigualdades.
A diferença salarial entre homens e mulheres, a exclusão do mercado formal e, portanto, da garantia de direitos além do não reconhecimento do trabalho doméstico diário são exemplos dessa desigualdade. Para nós as lutas sindicais e feministas nos campos dos direitos trabalhistas e da proteção social da mulher passam por olhar para a divisão sexual do trabalho como estruturante das relações sociais de sexo e também como base do modelo
explorador. Lançar luz sobre isso e ter um políticas que alterem essa realidade é parte fundamental da nossa plataforma.
A luta por creches e educação infantil é um exemplo de políticas que contribuem para alterar o padrão do trabalho doméstico e da reprodução social. Nossa recusa ao atual modelo que reforça a responsabilidade individual pelo cuidado com a casa e as crianças.
Exemplo disso é a pequena oferta de creches públicas no Brasil, apenas 20% entre as crianças até 3 anos. Essa reivindicação aponta para a importância da responsabilização pública pelo bem estar do indivíduo em contra posição a idéia de que a reprodução cotidiana está a cargo das mulheres.
É o trabalho cotidiano das mulheres no cuidado da casa, das crianças e dos doentes, lavando, cozinhando e arrumando que garante a sustentabilidade da vida humana. O capitalismo naturaliza que todo esse trabalho deve ser desempenhado pelas mulheres, como se fossem um tema privado, não ofertando assim serviços públicos, se apropriando o tempo e do trabalho das mulheres.
Marchamos por creches públicas em horário integral e outros serviços públicos que contribuam para a socialização do trabalho doméstico. Todavia, nossa agenda de transformações sociais profundas quer ir além da oferta de serviço e alterar as relações sociais garantindo que o trabalho doméstico também seja dividido com os homens.
Nossa luta precisa responder ao fato de que os trabalhos domésticos e de cuidado são a chave do limite da construção da autonomia para as mulheres e por isso parte estratégica de nosso projeto de mudanças.
Em Marcha por autonomia econômica
Avançar na construção da autonomia econômica passa também por uma política permanente de valorização do salário mínimo. Pesquisas mostram que a valorização do salário mínimo tem sido instrumento importante na diminuição da desigualdade entre homens e mulheres e por isso precisa ser parte da luta feminista e anti-racista hoje.
Para a Marcha Mundial das Mulheres o caminho para a igualdade também passa por políticas anti- racistas. Combater o turismo sexual e garantir direitos para as trabalhadoras domésticas são políticas que impactam diretamente as mulheres negras do Brasil.
As mulheres são maioria entre os trabalhadores informais e entre aqueles que recebem até dois salários mínimos, assim quando reivindicamos creches, salário mínimo, direitos previdenciários estamos melhorando a vida das mulheres, mas principalmente estamos mudando as estruturas da sociedade.
Temos dito que é imprescindível e urgente mudar a vida das mulheres para mudar o mundo e mudar o mundo para mudar a vida das mulheres.
Os dez anos da Marcha Mundial das Mulheres foram marcados por nossa critica radical ao capitalismo e patriarcado e é denunciando esse modelo que no ano de 2010 reafirmamos nosso compromisso dizendo que seguiremos em marcha até que as mulheres de todas as cores e lugares, nacionalidades e orientações, enfim, todas as mulheres sejamos livres.
Sarah de Roure é integrante da equipe da SOF e militante da Marcha Mundial das Mulheres no Brasil.